Quem sou eu

Uma entidade difícil de definir pelo formalismo lingüístico. Entretanto, enquanto sujeito, defendo a liberdade de crítica e pratico a crítica da liberdade. Conseqüência: caminhar sobre o "fio da navalha" buscando o equilíbrio entre a transgressão e a disciplina, entre o rigor e a suavidade; tendo como "sol", a iluminar-me e a apontar-me o horizonte, a emancipação conferida pela reflexão ética e como forma primeira de expressão: a poesia.

terça-feira, 29 de setembro de 2009

?

ADOLESCÊNCIA

Gostaria que o florir do encontro casual
Que flui ao vento do acaso
Dos que haverão de ficar estranhos
Não tocasse sobre nós

Gostaria que os olhares descrentes
E os sorrisos doentes
Que enfeitam palavras de episódio
De momentos pontuais

Não em nós se intrometesse
Não em nossa semente
Que nem sequer inchou
Que nem sequer germinou

Gostaria que as vis interpretações
Cúmplice das idéias funestas
Que fazem baixas as intenções
Nunca aqui fizessem festa

Gostaria que não nos orientássemos
Por faróis distantes
Nem por estrelas sem lume
Ao acaso de um olhar perdido

Quanto ao andarilho de ti em mim
Gostaria de vê-lo não passante apenas
Mas sim um alguém analista
Num que de sedentarismo mediante


E que as metafísicas perdidas nos cantos dos poréns
E as filosofias solitárias de tanta trapeira de falhas
Habitassem para sempre no poço das desilusões
Lá se mantendo em tempo perdido...

Gostaria que fossemos incasuais na alma
Assim como na vida
Se é que não somos frutos de ilusões
Ou de sonhos bastardos

Não sejamos jamais fantasmas
Que erram sobre recordações
De pingos de momentos
Quer felizes ou não

A razão, essa nossa mãe distraída
Deve cuidar para que sombras
E que a luz fúnebre desconhecida
Habitem a obscuridade merecida

Que os entes do fluído abstrato
Não façam de nossa viagem
Um correr, sem fim
Um sem fim de correr

Que as intersecções dos vazios
E as uniões dos nadas
Não passem nunca sobre nós

Eis aí meu maior desejo

HTSR/007714061981

Sem Propósito

ADOLESCÊNCIA

Dia triste este
Em que meu coração
Mais triste do que o dia
Canta, não cantos,
Mas monossílabos de ais

Dia triste este
Em que meu coração
Mais triste do que o dia
Deixou-me em desencantos

E se foi sem menos e sem mais

Já se foi o dia
Já se foi meu coração
Num dia fora do tempo
Num tempo fora do dia...

E o amor que em mim ardia
Extinguiu-se em inanição

Meu amor nasceu fora do tempo
E morreu quando não devia

HTSR/007614061981

A Flôr

ADOLESCÊNCIA

Toda vez que venho a este jardim
Vejo-te, belo jasmim...
Mais do que bela flor
És o retrato do amor

Tu querida flor
Mais uma vez sorriste para mim
Que bom querida jasmim
Fonte do meu calor

Neste inconstante jardim
Gostava mais d’outra flor
Que não tu jasmim

Mas ela murchou, mudou de cor

Dizem que plantas sentem
Eu sinto também
Vai ver que a outra flor não sente
Ou então não me entende

Pois muito me feriu
Quando não mais riu pra mim
Ela simplesmente se esvaiu
Se foi, minha querida jasmim

Mas tu pareces viçosa
Que bom que sejas assim
Pois só não quero farsa

Minha querida jasmim...

HTSR/007531 de Maio de 1981

Lavagem

ADOLESCÊNCIA

Por fim em mim choveu
E na água dissolveu-se
Minhas ilusões insossas
E meus sonhos insípidos

Por fim em mim choveu
E meu cérebro limpou-se
Deixou de andar às tontas
Atrás de desejos enlouquecidos

Olha o sol!
Já não era sem tempo
Há muito que o espero
Há muito que o almejo


Ah! Meu querido sol
És tu agora o meu esto
Em muito te desejo
Pois só contigo vejo

Por fim após a chuva
Começou em mim brotar
Novas flores, novos pensamentos
Que bom! Parecem ser variados!

Ainda que eu não vá
Ser mero otimista e amar
Todo e qualquer encanto,

Serei mais desmargurado...

HTSR/007431051981

À Moça da Loja

ADOLESCÊNCIA

Moça meiga da loja
Cativa-me teu ser dançante...
Tua imagem sorridente
Em minha memória se aloja...

Moça da loja musical
És, também, tão musical
És leve, breve e suave
Como um canto de ave

Meiga moça musical
Tão simpática e aromal
Tens nos lábios sorrisos

E no ser a liberdade do acaso

Baila o trigo quando há vento
Bailam teus cabelos quando há brisa
Se aqui te canto
É porque és toda uma sutileza

Morena de olhos amantes
Tão vivos, tão brilhantes
Se te escrevo poesia

É porque me excitas a fantasia...

HTSR/007318051981

Sem Título

ADOLESCÊNCIA

Cá estou, mais uma vez,
A ouvir um tique-taque
De horrível sotaque
Dum relógio reles

Sonhando tolo, indolente
Com a infante verdade
Com a senil inverdade

E com a ventura inconstante

Ouvindo estes tique-taques
E imaginando tanta sutileza
Sinto-me como se fosse ter um ataque
E ser transformado em brasa.

Antes fosse assim
Talvez sendo mais diáfano
Viveria menos em engano

E não me veria tão perto do fim

HTSR/007218051981

À Jaqueline

ADOLESCÊNCIA

Minha querida amiga
Te escrevo poesia
Com grande alegria
Que por ti meu ser afaga

É meu reconhecimento
Ao sentimento
É minha homenagem
À não bobagem

Faz pouco que nos conhecemos
Mas juntos vamos crescendo
Juntos vamos evoluindo
Que bom que assim estejamos

Faço poesia por qualquer coisa
Que não seja mera coisa
E para mim tua amizade
Tem algo de verdade

Verdade que me apaga a tristeza
Da sombra da incerteza
Da dúvida enfatizada
Da descrença incontrolada

Em nossos momentos de conversa
Minha solidão então descansa
Deixando-me mais forte

E até mais contente

Tudo isso pode ser um nada
Mas na estrada da vida
Muita coisa é incompreendida
Muita coisa é esquecida

Tendo-se, porém um amigo
Nos sentimos mais algo
Nos sentimos menos nada
E até damos risada

Mas a amizade é tão efêmera
Tão fugidia
Que me lembra fantasia
Sim. Doce quimera

Mas eu não a quero assim
Quero-a bem real a mim
Assim é mais gostosa
Assim é mais valiosa

Por isso querida amiga
Te escrevo poesia
Sem mera utopia

Porque te quero sempre amiga

HTSR/007116051981

Sem Título

ADOLESCÊNCIA

Por trás de minha boca sorridente
Se esconde um coração que chora
Poderá lhes parecer agora
Brincadeira de romântico doente
Talvez o seja
Talvez não o seja
Mas o não duvidar

Já é um grande ajudar

HTSR/007016051981

Adeus ao Sentimento

ADOLESCÊNCIA

Estou triste de ser carinhoso
Estou cansado de ser sentimental
É tudo tão igual
Que sou tomado ao acaso

Quero perder meu sentimento
Não quero mais ser amoroso
Me é fonte de desgosto
Me deixando menos vigoroso

Tenho vergonha de mim
De ser tão tolo assim
Por tanto gostar
Por tanto amar


Tenho muitos remorsos
Por ter vivido
Por ter iludido
Foi tudo falso

Vivi em vão
Me iludi debalde
Só ouvi o som do não
Na busca da felicidade

Adeus amor
Adeus gostar
É muita dor

Vou me sepultar.

HTSR/006916051981

sábado, 19 de setembro de 2009

Saudando a Morte

ADOLECÊNCIA

Queria agora estar morto
E o espaço etéreo habitar
Queria solto ao vento
Livremente vagar

Como queria estar
Morto, bem morto
E feliz gozar
Da morte seus encantos

Quando eu novamente morrer,
Batam muitas latas!
Que bom vai ser!

Aproveitem bem a festa!

Minha morte será um dia de alegria
Estará encerrada a torpe alegoria
Chamem acrobatas com suas piruetas
Chamem palhaços com suas caretas

Soltem balões
E diversos foguetões!
Muita gente convidem
Riam, brinquem e cantem

Que saudades da morte
No dia que a encontrar
Quero festa de alegrar

Pois me foi um dia de sorte.

HTSR/006816051981

Sonhando-me em Planta

ADOLESCÊNCIA

Queria ser planta
Sim verde planta
Que não fala, não ouve
E também não vê

Mas sensitiva ela é
Assim como meu ser o é
Mas meu ser fala e ouve
E também vê


Por isso sou tão triste
Por ser inteligente
Quisera ser planta

Somente verde planta

HTSR/006711051981

Poeminha

ADOLESCÊNCIA


Pensei em ti esta noite
Mas não passou de sonho
Nele fé não ponho
Seria grande tolice

O que foi o sonho?
Não posso contar
Deixa de ser sonho

O bom é imaginar

Queria ser mágico
Seria fantástico
Transformaria sonhos em verdade
Fantasias em realidade

Mas não sou mágico
E por tão pouco
Imateriais ficam os sonhos

Continuando a serem sonhos

HTSR/006611051981

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Fracionado

ADOLESCÊNCIA


Sou parte de minha alma
De minha alma errante
De minha alma inconstante
Ora agitada, ora em calma

Longe de mim existo
Existo, mas não sou visto
E de lá vejo a mim
E acompanho a mim


Sou parte de minha alma
De minha anfíbia alma
Vivo um pouco na verdade
Outro pouco na inverdade

Já houve um tempo que eu era um só
Mas quanto mais vou ficando só
Vou compassadamente morrendo

E devagar me dividindo

HTSR/006511051981

Fulano

ADOLESCÊNCIA


Eu me chamo fulano
Sim: Fulano
É este meu nome

Sou o Fulano
Que nasceu de ninguém
Que não tem ninguém

Sim, eu sou o Fulano
Vítima de um engano
Vítima de um acaso

Sim, sou fulano
Fulano eu hei de ser
Fulano eu hei de morrer

Ninguém quis saber de mim
Porque não estou em mim
Vivo como um ninguém

Sou fulano
Mero Fulano
Fulano eu hei de morrer


HTSR/006411051981

Então era tudo falso

ADOLESCÊNCIA

Aqui existe falsidade
Sim... muita falsidade
Como isto me entristece
Como isto me enfraquece

Por que, entre tantos “mundos”,
Ela escolheu logo este?
Este pequeno mundo
Para espalhar sua peste?

Logo o meu mundo
Meu triste mundinho
Onde pus tanto sonho
Onde ainda vinha sonhando

Quanto me foi de amor
Quanto me foi de calor
Quanto me foi de vida
Só de vida mentida

Dizem que finjo ou minto
Tudo que escrevo. Não!
Eu só transmito
O que me sente o coração.

Aqui é tudo tão falso
Que pensam que também sou falso
Assim fosse meu pensamento
Assim fosse meu tormento

E eu que pensei ter encontrado alegria
Vi que é uma alegoria
Que em uma dor imensa
Só quer dizer farsa

Vazio encanto ébrio de si
Só de segui-lo me perdi
Por que o desejei?
Quanto me iludi!

Tudo que sonhei é um enigma
Que se esconde não sei onde
E a minha alma já cansei
De procurar debalde

O que me dói tanto
Não é o que há no coração
Mas sim o desencanto
Dessas coisas que nunca existirão

São formas sem forma
Que passam depressa
Sem que conhecer as possa
Ou as sonhar a alma

Porque é tudo tão falso
No que há e no que penso?
É tudo um indesejo
No mundo que vejo

Contemplo o que não vejo
Num tarde quase escuro
E quanto ao meu desejo
Ficou além de um muro

O amor me foi começado
Num ideal que não acabou
Mas que já se enfadou
Por ser tão enganado

Sonhei que fui feliz
Veja o mal que fiz
Me enganei tanto
Que estou ficando morto

Como um réquiem de saudade
Estou compondo esta poesia
Na dor que minh’alma esvazia
Rindo triste da verdade

Antes fosse tudo inverdade
Não perceberia a falsidade
Não sonharia tanto
Não almejaria tanto

Quando se pensa ser amado
Na verdade nem se é gostado
É-se um mero esquecido
Um pobre desprezado

Oh triste verdade
Triste verdade
É tudo tão falso
Tudo tão falso

Por que fui descobrir isso agora?
Pobre de minha vidinha
Pobre coitadinha
Tão boba, tão sonhadora

Tenho tanto sentimento
Que me perco em pensamento
Imaginando a falsidade
Ser uma tímida verdade

Se fosse outro, seria outro
Se em mim houvesse certeza
Não seria fluído neutro
Teria decerto mais firmeza

Mas já me ronda a incerteza
Dum mar de dúvidas e poréns
Me falta a clareza
Que de ao meu sofrer amén

Então me iniciaria na luz
Ainda que em dia tristonho
Porque o limiar é medonho
E todo o passo é uma cruz

Mas tudo isso é ufanismo
Minha crença é infantil
Mas o mundo é mesmo vil
Um poço de demagogismo

A minha vida sentou-se
E não há quem a levante
Ela já está doente
Minha vida fartou-se

Fartou-se do que é falso
Da almejar o que não posso
Torpe mundo de cinismo
Fez de minha vida um cataclismo

Só agora descobri
O que realmente me rodeia
E de vergonha me cobri
De ver onde meu ser devaneia

Entre o que vivo e a vida
De minha atual estada
Prefiro aquela descida
Que me leva ao nada

Qualquer coisa me valerá
Melhor que a vida que tenho
Esta vida de estranho
Que só me dilacera

Tivesse eu conseguido
Nunca saber de mim
Ter-me-ia esquecido
De ser real assim

HTSR/006310051981

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Fim de Dia

ADOLESCÊNCIA

Começa-se ir o dia
A noite vem chegando
E vem chegando
E vai-se indo mais um dia

O céu azul começa
Adquirir a negrura
Da sua noite escura
Onde toda clareza cessa

E a triste vermelhidão
De um céu azul-cinzento
Vai-se perdendo na escuridão
De um céu cada vez mais preto

Trocaram de lugar
Sem qualquer intento
Um frio sem vento
Uma brisa sem mar


E como que doente
Emerge vagamente
No fim do céu
Uma lua que amarelou

As estrelas, tão longe,
Nem sequer nos iluminam
Ficam lá: tão longe
Apenas brilhando em vão

O céu de luto
Tão preto em seu véu
Me parece mais preto
Preto como o breu

Vai-se mais um dia
Com a escuridão sua graça esvazia
E o ar na noite vazia

Dorme esperando o novo dia

HTSR/006208051981

Em Memória de Bach

ADOLESCÊNCIA

Ouço a Tocata e Fuga em Ré Menor
Que coisa linda! Que obra de esplendor!
São profundos os seus motivos,
São tão doces tão altivos!...

Os acordes difundem-se pelo ar
E o órgão parece-me transportar
À mil setecentos e vinte e sete
Época da verdadeira arte

Imagino-me em Leipzig, todo importante
Não existe coisa mais imponente
Viver o Barroco de Bach
E seus belos sons escutar


Tocata: um trecho de bravura
Em Bach prima por independência
Como dignifica minha paciência
E deixa minh’alma mais pura

A fuga com seu maravilhoso sujeito
E seu belo contra-sujeito
Toda escrita em Dórico
É algo magnífico

E eu escutando Bach
Fico a me deslumbrar
Com seu som to pleno

Com seu toque sobre-humano

HTSR/006108051981

Além do Tédio

ADOLESCÊNCIA

Rasteja mole por campos ermos
Meu pensamento insossegado
Rasteja mole por campos ermos
Por estar assim tão cansado

De mim fugiu meu pensamento
Sozinho ele deixou a mim
Vai ver que eu lhe era um tormento
Por isso ele deixou de mim


Escrevendo só por inércia
Mexo a mão indolente
Fazendo no papel carícia

Sem saber do meu pensar
E sem querer saber

Por que não sei pensar

HTSR/006006051981

Esperando Alguém

ADOLESCÊNCIA

Meu coração nutre uma idéia triste
A idéia de que nunca vou ter alguém
Por que viver sem ninguém?
Que triste sorte!

E essa idéia, como que um sabre,
Reduz minha’alma a um casebre.
Triste, triste idéia
Por que por mim vagueia?

E os dias vão passando
E a idéia vai crescendo
E meu coração vai ficando descrente
E eu vou ficando mais triste


Que essência amargural
Essa de não ter ninguém!
Como tal
Também me sinto ninguém!

Não durmo, nem espero dormir
Porque não consigo dormir
Oro e digo amén

Esperando por alguém...

HTSR/005902051981

O Poção

ADOLESCÊNCIA

Hoje fiz um passeio mui lindo
E sonhei com sonhos mui lindos
Fiquei romântico outra vez
E esqueci-me do meu talvez...

Comecei numa estradinha de barro
Onde passa muito pouco carro
Dei uma de caminhante
E fui a pé bem contente

Vi flores vermelhas, azuis e rosas
E borboletas de coloridas asas
Ouvi cigarras cantantes
E vi libélulas dançantes

Vi árvores copadas
E palmeiras bem altas
Ouvi a música aguada

Que o riacho libera

Então, como o vento da floresta
Minha emoção não teve fim
E, assim, todo em festa
Sorri de novo para mim

Toda árvore era um movimento
Toda flor era uma alegria
Meditei sem ter pensamento
E criei mil fantasias

Como que imitando um Beethoven
Ou um Mozart
Ou, ainda, um Chopin
Tentei cantar toda essa arte.

Nestes singelos versos
Coisa de romântico indolente
Que escreve versos e versos

Sem saber o que tem em mente

HTSR/005802051981

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Eu?

ADOLESCÊNCIA

Quem sou eu?
Será que eu sou eu mesmo?
Ou, simplesmente, me imagino eu
Assim, sem nenhum esmo?

Será Que minha alma se lembra de mim?
Ou do que fui de mim?
Ressuscita-te memória!
Conta-me minha história!

Quando penso em mim
Sinto-me como num mar de lembranças fluídas
Ou num lago de bobas nostalgias
Ou, ainda ,no Oriente entre trapos de cetim

Serei eu alegre ou triste?
Gostaria de melhor saber
Para melhor me pertencer
E descobrir o que no coração existe

O que será a tristeza?
Existe nela clareza?
O que será a alegria?
Será ela só fantasia?

Gostaria realmente de saber
Porque não sei o que fazer
Quando sou o bobo triste
Ou o alegre demente

Vezes me vejo tão atento
E noutras tão disperso
Que em cada pensamento
Me torno mais diverso

Acho que minha alma
Condiz com o que não existiu
É algo que nem se doma
Uma coisinha que sumiu

Serei eu alegre ou triste?
Não vejo razão de na tristeza me esconder
Ou de na alegria me perder...

É tudo um grande embuste

Vai ver que sou alegoria
Me rio com a tristeza
E choro com a alegria
Que interessante estranheza

Se vivo é porque me perdi
Se amo é porque não amei
Serei mesmo complicado
Ou somente iludido?

Às vezes tenho saudades de mim
De quando não era assim
Mesmo sem saber de mim
Ou se já tive começo ou fim

Talvez esteja iniciando
Ou, ainda, me findando
Não sei bem ao certo...
Nem posso saber tanto...

Triste momento que um olhar
Sorriu incerto para mim
Deu em minha alma lugar
À um Ser inconstante assim...

Já fui adulto na infância
E criança na adolescência
Agora, adulto não sou nada...
Talvez, uma obra inacabada...

Cansa pensar demais
Pensar nunca tem bom fim
Em não saber de mim
Não me sinto de menos nem demais

Afinal, alegre ou triste?
Em verdade não sei
Sou qualquer coisa que existe
Algo como que “agnus Dei”

E por que não?
Num momento de então
Sou ente que Deus fadou

E que, decerto, aqui pousou...

HTSR/005730041981

Minha Alegria

ADOLESCÊNCIA

Um dia andei contigo
Entre ramos de trigo
Como que prenunciando prosperidade
Como que prenunciando juventude

Sim, contigo andei
E contigo amei
Sorridentes e tal
Num passeio ideal

As melhores paisagens contigo eu vi
E os melhores momentos contigo vivi
Sonhei que era teu
E não me senti mais Prometeu

Numa volúpia de ouro
Atiramo-nos um no outro
Esquecendo-nos da dor
Nos fundindo no amor


E tu, como que borboleta
E eu como que bêbado
Fui sonhando
E tu fazendo festa

Virei poeta
Virei artista
Sonhei com a felicidade
Esqueci-me da fatalidade

Senti-me como flor
E zombei até da dor
Fiz para minha vida
Uma canção querida

Mas um dia foste embora
Senti-me de novo no agora
E as coisas belas de outrora

Passaram que nem hora

HTSR/005611041981

Bem ou Mal

ADOLESCÊNCIA

Esse dom que me inunda
Em meu eu demente
É como um culto doente
Só de vazios e nadas

Que em minh’alma coexiste
E que consiste o meu Ser
Acompanhando-me em vácuos e diafanidades
Na minha pouca idade


Não sei porque em mim existe o bem
Esse bem que é mau e me faz sofrer também...
Mas já que vivo de ilusões promissoras
Talvez me anestesie outras tantas bobeiras

Amo, entanto, esse mal de que sofro
Não sei porque, mas amo e sofro
Talvez de tanto amar e sofrer

Morra de pesar e prazer

HTSR/005504041981

Moda de Amor

ADOLESCÊNCIA

Buscar, querer, amar... tudo isso diz
Perder, chorar, sofrer, vez após vez
Não há para tais intentos um talvez
Só há um constante ser infeliz

Às vezes penso se ainda amo
Ou se apenas me domo
Transformando-me em algo amoroso

Assim como um bobo sedoso

Blá, blá, blá
Blá, blá, blá
Aí está o canto do amor
Já sei até de cor

Falar de amor já foi moda
Não existe mais amor para se cantar
Pensar em amor é se enganar

Pois agora ele é conto de fada

HTSR/005421031981

Lira dos 19 anos

ADOLESCÊNCIA

Dezenove anos no rosto insone e gasto
Que ainda sorri primaveril em meio
A dor onde um saudoso sonho casto
Talvez me inflame e purifique o seio

Veio-me a adolescência e o amor me veio
Amei! Fui infeliz e agora pasto
A dor e a tristeza num campo cheio

Vendendo o espírito flácido e nefasto

E a angústia como que de açoite
Ou a doença que me dilacera
Me alugou e feriu na última noite

Vi ilusões... juras de amor
Senti-me morrendo num hospital

Sonhando amor num lamaçal

HTSR/005320031981

Como Bolas de Sabão

ADOLESCÊNCIA

Como bolas de sabão
Vejo o tempo passar
E a vida escoar

Como bolas de sabão
Leves e frágeis
Tenho os desejos em minha mão

Como bolas de sabão
Vão para o alto

As esperanças de então

E lá, bem no alto
Se desfazem num só ato
Em flóculos de espuma

Na água ensaboada ponho um tubo
E sopro novas bolas de sabão

Sonhando novamente em vão

HTSR/005220031981

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Retrospecto do Nada

ADOLESCÊNCIA

Por que em mim é tarde
Por que, afinal, me sinto perdido?
Assim vazio e cansado?

Por que em mim a febre arde
A febre das saudades imprevistas?
A febre dos tolos suicidas?

Sinto-me na hora parada
Na hora estagnada
Na hora do nada!

No espaço lúgubre
Como ponta de sabre
Sinto o vazio do tempo

Por que a emoção indefinida
Me corrói a vida
Minha vida enfadada?

Por que canto a amargura
Estou acostumado à desventura
Foi sempre assim

E eu, bastardo do sentimento
Perdido na areia da praia
Ainda sonho com fantasia

Onde estou o som marulhoso
Me faz melindroso

Afogando-me em desejos

Mas de que me valem
Não passam de sonhos
E sempre tacanhos

Meus olhos perdidos
Contemplam o céu de cor cinza
Do horizonte infindo

Com suas nuvens azuladas
Com seu ar esfumaçado
Pesado e entristecido

E me sinto mais no nada
Na hora insalubre
Na hora parada

Em mim já é tarde
Muito, muito tarde
Um tarde infinito

De momentos apagados
De esperanças mortas
De séculos inteiros

Minh’alma então cansada
Pelo mar vagueia
Sem noção e sem idéia

Buscando barcos perdidos
De velas rasgadas

Para sempre esquecidas

HTSR/005120031981

À Flautista

ADOLESCÊNCIA

Poucas vezes te vi tocar
Mas teu tocar é um inflamar
De cores cintilantes
De motivos verdejantes

Riquezas que despertam inveja!
Ainda que não se veja
Prata ou ouro de esplendor,
Mas sim sons de amor...

Minha poesia ingênua
É de simplicidade nua
Comparada a teus trinados
Não passa de leve folguedo

Quando, suave tocas
Tuas mínimas e colcheias
Tudo se reduz a essências
Como num sonho de fadas

Teu espírito habita a imensidade
Uma ânsia sutil de liberdade
Agita as formas fugitivas
De tua criação festiva


Só te conheço em parte
Se te escrevo poesia
É porque teu ser dançante
Transporta-me à alegria

Numa graciosa melodia
Toda a tua alma se esconde
Reminiscências do aonde
Inspiram-me a nostalgia

Quisera poder musicá-la
O alegro, o adágio, o andante...
Nela seriam brilhantes
Em tons de sol, mi, lá..

E este quê de poema
Com arpejos e comas
Tornar-se-ia digno de Mozart

Símbolo de verdadeira arte.

HTSR/005028021981